Caminhos de uma nova escrita. E de novas possibilidades de leitura.

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Ítalo Puccini*


O mundo já é apresentado enquanto escrita, o que requer leitura e interpretação (LAJOLO, Marisa & ZILBERMANN, Regina).


A história da escrita e das línguas está longe de terminar, pois o caráter da escrita é imagético e transitório. Hoje falamos e escrevemos em português, mas há muito se cogita a criação de uma linguagem universal (uma tentativa foi o Esperanto, no século XIX) para unir todos os povos. A internet pode ajudar nesse processo, mas será possível? O tempo dirá.

O que temos hoje é quase que um retorno às primeiras formas de escrita registradas pela civilização. E é no espaço virtual que se pode observar esse retorno, essa busca por novas formas de expressões (e, sabe-se, nem tão novas assim).

Tem-se, por exemplo, a escrita fragmentada, enxuta, que pouco diz, mas que muito quer ser entendida. As abreviações são modelos clássicos nisto. Uma escrita mais rápida, mais dinâmica. Apenas um reflexo social. Nesse ritmo alucinado de vida, nada mais natural ao ser humano que registrar de maneira breve, sucinta, econômica aquilo que é anunciado, seja oralmente, seja de forma escrita.

Desde a popularização da internet, durante os anos 90, foram muitas as mudanças nos hábitos de escrita e de comunicação no mundo todo. Primeiro foi o surgimento do e-mail, depois vieram as salas de bate-papo e os comunicadores instantâneos (como ICQ e MSN) e, finalmente, os blogs e as redes sociais (Orkut, Facebook etc.), hoje tão populares entre os adolescentes quanto diários e papéis de carta um dia já foram. Em meio a essas mudanças, com o advento de novos recursos e ferramentas comunicacionais, o internetês – nome dado à grafia abreviada utilizada na internet – acabou se desenvolvendo e cristalizando-se à medida que a rede mundial de computadores evoluiu.

É por estes caminhos que a escrita hoje em dia mais acontece. É por aí que mais se relacionam as pessoas. Através de textos curtos, repletos de espaços de preenchimento aos leitores. Uma escrita que ao mesmo tempo anuncia algo, mas que não diz este algo em sua totalidade. Uma escrita que procura despertar a atenção e o interesse. Mas que não se aprofunda. Prova maior disso é o microblog twitter, ferramenta em que seus usuários escrevem textos de no máximo 140 caracteres (esta é uma frase neste modelo, do “Prova” até “caracteres”). A máxima ‘menos é mais’ nunca fez tanto sentido como nos dias de hoje.

É isto com o que nos deparamos no livro “Das tábuas da lei à tela do computador”, das escritoras Marisa Lajolo e Regina Zilbermann (Editora Ática, 2009). Um cuidado em resgatar toda a história do surgimento do texto escrito, das primeiras formas de expressão do ser humano, e das maneiras de se fazer entender oriundas daquela época.

Seguindo esse caminho, como não poderia deixar de ser, ainda mais se levando em conta que a leitura, sem a escrita, não faria sentido, sendo a recíproca a maior prova da afirmação, as autoras apresentam ao leitor um panorama das diversas possibilidades de leitura com as quais hoje nos confrontamos, sejam, estas possibilidades, em termos da ação do ato de ler, quanto no que diz respeito às ferramentas utilizadas para estas leituras – exemplo do meio digital Ipad, um recurso de leitura que armazena vários e vários livros em uma tela um pouco menor do que um notebook.

Assim sendo, também, com o conceito de escrita, uma vez que a escrita mais disseminada pelo meio virtual demonstra um movimento de retomar a escrita desde sua invenção: através de sinais, de caricaturas, os hoje chamados emoticons. Bastam ser observadas expressões escritas para designar sentimentos, como :( :) *--* ^.^ =D =P ¬¬ =O =B

Os emoticons [fusão das palavras inglesas emotion, "emoção", com icon, "ícone"] são amplamente utilizados por internautas para expressar humor e sentimentos durante troca de mensagens. Além disso, a maioria dos atuais comunicadores instantâneos já consegue decodificar essas combinações tipográficas e traduzi-las por equivalentes pictóricos, alguns inclusive com movimentos animados, de modo que ao digitar :) a seqüência se transforme imediatamente no desenho de uma "carinha feliz", assim .

Esta aproximação muito grande entre tecnologia e escrita e leitura impõe ao ser humano, ao mesmo tempo em que permite a ele, uma capacitação para bem fazer uso de recursos como estes em prol de sua comunicação. Comunicação esta que a cada dia sofre interferências e alterações, seja na maneira oral, seja no modo verbal-escrito de se expressar. Conforme dizer das autoras, a escrita gira em órbitas da oralidade, enquanto que a leitura recompõe a unidade perdida entre as duas ações anteriores.

Estar alheio a essa contínua transformação é o mesmo que se alienar socialmente. Neste mundo não-linear, neste ritmo de vida que também não segue em linha reta e definida, não teria como ser diferente no que diz respeito às formas de comunicação e de interação. Temos um conhecimento não mais preso a uma página impressa ou a uma parede. Toda leitura, de todo e qualquer movimento, torna-se uma escrita em potencial, uma nova possibilidade de pensar e de agir e de se fazer ouvir.



Referência Bibliográfica:

LAJOLO, Marisa & ZILBERMANN, Regina. Das tábuas da lei à tela do computador: a leitura em seus discursos. 1ª ed. São Paulo: Ática, 2009.


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2 comentários:

Rodrigo disse...

Um globo de óculos, vira glóbulos
Um lobo de óculos, vira lóbulos
e um óculos de óculos, vira binóculos. Repetindo as palavras do Caparelli que levamos a Portugual. Nada mais está preso ao que é, tudo é passível de transformação. A escrita não ficaria longe disso, com certeza. Um novo tempo, um novo jeito de expressa-se. Multi-facetado, eu diria. Muito legal, Ítalo. Parabéns!
Rodrigo

Eduardo Silveira disse...

lajolo, zilbermann, livro novo delas, resenha do ítalo? --->@____@

curti a resenha, o livro deve ser ótimo.

abraço!

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