O caminho de Caminha: salvar essa gente

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Por Cleber Fabiano da Silva e Sueli de Souza Cagneti

            A famosa carta a El-Rei Dom Manuel, escrita em abril de 1500, relata em forma de diário os nove dias que a frota de Cabral permaneceu no Brasil. De modo pormenorizado, nela são apresentados vários aspectos sobre o espaço, os caracteres físico-psíquicos e o modo de viver dos habitantes nativos, bem como, as possibilidades de exploração dessas novas terras.
De notável importância documental, essa epístola deve tornar-se conhecida de todo brasileiro por ser parte constitutiva de quem somos como povo e herdamos como cultura. Para tanto, há que se levar em conta, o seu registro num português arcaico e distante de nosso tempo, bem como, a necessidade de contextualização espacial e temporal para marcar a dimensão do assombro no momento do encontro dessas duas culturas.
Numa versão ilustrada em linguagem atual, A carta de Pero Vaz de Caminha, de Poliana Asturiano e Rodval Matias, editora FTD, o leitor poderá ter acesso a esse documento que permaneceu desconhecido por quase três séculos e foi publicado pela primeira vez em 1817. Com explicações sobre o autor, a obra, o período de expansão do comércio e da fé e as viagens dos portugueses, o livro proporciona um conhecimento do contexto e uma visão panorâmica dos fatos. Traz ainda detalhes sobre a frota, as naus, caravelas, as embarcações e seus capitães e os instrumentos de navegação são atualizados com riqueza de detalhes nessa inusitada viagem rumo à gênese de nossa história.
Embora não seja considerada literatura, trata-se de crônica histórica e serve como testemunho de um tempo marcado por uma visão de mundo mercantilista e pela necessidade de conversão a uma cristandade medieval. “A conversão dessa gente deve agradar ao Nosso Senhor, pois certamente são gente boa e de boa simplicidade. Podem ser facilmente amoldados, segundo o molde que lhes quiserem dar”. (p. 64)
A descrição dos nossos indígenas é feita pelos primeiros observadores do Brasil como um ser dócil, de quem se dizia da aparência: “A pele deles é parda, meio avermelhada. Eles têm bons rostos e narizes; e são bem feitos. Andam nus, sem nada que cubra seus corpos, e não fazem o menor caso de cobrir e mostrar suas vergonhas; e são tão inocentes nisso como ao mostrar o rosto”. (p. 29).
A leitura da missiva de Caminha permite compreender o imaginário edênico que por séculos povoa o modo como o estrangeiro e – o próprio brasileiro – percebe os nossos indígenas e a nossa terra, e informa (afinal já era essa a sua função) o caminho – percorrido ainda hoje por missionários, estudiosos, políticos – indicado por Caminha: “Porém o melhor fruto que se pode tirar dessa terra me parece ser salvar essa gente”. (p. 77).

FICHA TÉCNICA:

Obra: A carta de Pero Vaz de Caminha
Versão ilustrada de Poliana Asturiano e Rodval Matias
Editora: FTD
Ano: 2004


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