Percepções sobre “O Ratinho, o Morango Vermelho Maduro, e o Grande Urso Esfomeado”

/
1 Comments
Ao longo do terceiro bimestre da disciplina de Literatura Infantil Juvenil, a professora dra. Berenice Rocha Zabbot Garcia desenvolveu uma atividade com os acadêmicos do 2º ano de Letras, que consistia em construir um texto híbrido a partir da análise de obras infantis juvenis por ela selecionadas. Os textos consistiam em uma resenha crítica da obra e uma leitura comparativa analisando sua relação com contos de fada. O resultado de um dos trabalhos desenvolvidos pode ser conferido abaixo!

Percepções sobre “O Ratinho, o Morango Vermelho Maduro, e o Grande Urso Esfomeado”

Karina Steiner
Luana Seidel
Victória Maria Nielson

O livro “O Ratinho, o Morango Vermelho Maduro, e o Grande Urso Esfomeado”, publicado pela editora Brinque Book e escrito por Don e Audrey Wood, trabalha com as questões do imaginário do leitor no momento de percepção do texto, graças às ilustrações de Don Wood.
A narrativa inicia com a ilustração de um pequeno rato saindo de sua casa carregando uma escada de madeira, e a primeira surpresa do leitor é causada pelo texto verbal: é a fala do narrador, que não é direcionada para o leitor, e sim para o personagem do Ratinho, questionando-o sobre o que ele está fazendo.

Em geral, obras de personagens animais tendem a ser classificadas como fábula, onde esses falam, e têm intenção de expor a moral da história, dividindo-os em bons e maus, final feliz ou infeliz. Este, porém, não é o caso desta obra. O personagem é objeto da conversa direcionada do Narrador, mas não responde verbalizando, o faz apenas com gestos e reações ao que lhe está sendo dito. Desta forma, no decorrer da história, o Narrador traça uma espécie de diálogo nessa interação com o Ratinho.

Seguindo a trama, o Narrador percebe que o Ratinho está indo em direção a um morango vermelho maduro. Percebemos que apesar de nada ter a ver com a história da Chapeuzinho Vermelho, ainda está demarcada a presença da cor vermelha, representado pelo morango maduro.
Enquanto o Ratinho está trabalhando para conseguir colher o morango, que é praticamente do seu tamanho, o Narrador o avisa sobre o perigo do grande Urso Esfomeado, ressaltando o quanto este gosta de morangos vermelhos e maduros! O personagem do Ratinho demonstra preocupação e medo através de suas feições, e continua trabalhando, cada vez mais rápido, para colher o morango, enquanto o Narrador continua descrevendo o Urso, que é um bom farejador de morangos vermelhos maduros - principalmente os recém colhidos, uma vez que o Ratinho conseguira soltar o morango.
O Ratinho, na tentativa de evitar que tenha seu morango roubado, procura protegê-lo e escondê-lo. O detalhe que serve de investigação na história é que, durante toda a narrativa, o personagem do Urso Esfomeado, que é colocado como vilão, não aparece, e a única evidência da sua existência é o discurso do Narrador, que apresenta a solução para que o Urso não possa pegar o morango: cortá-lo em dois e dar a metade para o Narrador, para que então os dois possam devorar a fruta por inteiro. Por fim, é esclarecido que, assim tendo sido devorado, o Morango não poderia mais ser roubado pelo Urso.

Apesar de não ter sido representado nas ilustrações de Don Wood, a presença ou não do urso é trabalhada como uma figura selvagem e perigosa, deixando o suspense das possibilidades de culpa, assim como de costume nas narrativas infantis.
Contrariando a possibilidade de legitimar esta obra como fábula, o fim não possui cunho moralizante, pois permite a dúvida sobre o enredo. O Urso Esfomeado era real? Poderia, o Narrador, ter usado tais ameaças para manipular o Ratinho e se beneficiar com o alimento? Ou até mesmo o Ratinho, criando a ilusão dos avisos do Narrador para comer o Morango por inteiro, demarcando o Princípio da Realidade e Princípio do Prazer, quando o desejo de devorar o alimento por inteiro o faz extrapolar a possibilidade de poupá-lo. Pouco se pode deixar estabelecido como certo sobre o final da história, além de que a intenção do autor foi, provavelmente, intrigar o leitor para as possibilidades de desvendar.

Sabendo que as narrativas de hoje são, invariavelmente, influenciadas pelas narrativas primordiais e clássicas, pode-se relacionar aspectos relacionados entre esta obra e contos das Mil e Uma Noites. Bettelheim, na sua obra, discorre sobre As Maravilhosas Viagens de Simbad, ou Simbad, o Marujo, sobre o conflito entre as personalidades de um mesmo personagem, impossibilitando legitimar o real e o irreal “os contos de fadas têm diversos níveis de significado. Num outro nível de significado, os dois protagonistas dessa história representam as tendências conflitantes dentro de nós que, caso não consigamos integrar, certamente nos destruirão”. Essa história pode não apresentar uma moral, mas o cunho manipulativo do Narrador nos remete às histórias contadas pelos pais da nossa geração, quando tentavam nos intimidar para que obedecêssemos, como a história do "Homem do Saco", por exemplo, que mesmo não fazendo parte dos contos clássicos, ou primordiais, fazia de fato, parte da 

WOOD, Audrey; WOOD, Don. O Ratinho, O Morango Vermelho Maduro e O Grande Urso Esfomeado. São Paulo: Brinque-Book.

BETTELHEIM, Bruno. A Psicanálise dos Contos de Fadas. São Paulo; Paz e Terra, 2014



Karina Steiner é graduanda em Letras (Língua Portuguesa e Inglesa) pela Univille. Adora viajar para dentro das histórias que lê, e leva no coração as pessoas e lugares incríveis que conhece nelas.

Luana Seidel é graduanda do curso de Letras da Univille, trocou o oxigênio por arte há tempos – e não se arrepende disso.

Victória Maria Nielson é graduanda em Letras (Língua Portuguesa e Inglesa) pela Univille, nas horas vagas aventura-se desbravando o mundo por trás da lente de uma câmera, ou simplesmente desfrutando de um bom dia em meio à natureza.


Posts relacionados

Tecnologia do Blogger.