Ponto final?

/
0 Comments
Nicole Barcelos

Um dia, os pontos decretaram greve! Quais pontos, você há de perguntar?! Ora... todos! Em Greve, livro de estreia da portuguesa Catarina Sobral, publicado no Brasil pela WMF Martins Fontes em 2014, todos os pontos deixam de trabalhar, de uma hora para outra. 

Primeiro, lá se vão os pingos nos Is, pontos finais, e todos os seus companheiros da língua, arruinando a comunicação escrita. Mas logo a situação afeta outros setores da vida cotidiana, dos esportes (como haverão de contar os pontos?!) à TV (o que fazer sem o teleponto?), passando ainda pela costura (pobres bordadeiras...) e até pela medicina (como fechar machucados?). Somem até os pontos de vista e de fuga, e mesmo a geografia se vê afetada sem os pontos cardeais ou de referência!

Nessa deliciosa obra, Sobral brinca com a multiplicidade de “pontos” presentes na língua portuguesa através das mais diversas expressões idiomáticas possíveis, em um texto cheio de surpresas à cada virada de página. As ilustrações, também assinadas por ela, constituem elemento fundamental de suas narrativas, e em Greve não poderia ser diferente. Misturando técnicas de desenho e colagem, a autora dá à dimensão semântica dos seus jogos de palavras ainda outras possibilidades de leitura, já que há uma riqueza de textos dentro de seu próprio texto que conversam entre si e com outros (assim, intra e intertextualmente), estabelecendo jogos mais ou menos explícitos com livros, filmes e elementos da cultura ocidental. O emprego de tons semelhantes ao sépia e o destaque a uma cor em particular também se faz notar, uma vez que certamente sugere algumas outras leituras do que Catarina Sobral pode estar sugerindo em sua divertida história dos pontos.

Para leitores de qualquer tamanho, a multiplicidade de linguagens e sentidos aos quais se faz aberta essa obra certamente nos provoca a olhar com outros olhos a nossa própria linguagem e as veredas pelas quais se pode caminhar por ela. Muito além da palavra escrita, os significados despertados aqui são prova de que texto visual e verbal andam lado a lado, de mãos dadas, e ponto final.



Nicole Barcelos é graduanda em Letras na Univille (Língua Portuguesa e Língua Inglesa). Atua como bolsista do Prolij e vive se perdendo em buracos de coelho.


Posts relacionados

Nenhum comentário:

Tecnologia do Blogger.